Medida para aliviar gastos das famílias pode agravar desigualdade e esvaziar escolas públicas, segundo educadores e especialistas em políticas públicas.
A decisão do governo japonês de tornar o ensino médio praticamente gratuito, inclusive para escolas privadas, está gerando preocupação entre educadores e especialistas em políticas públicas. Embora a medida busque aliviar os gastos das famílias em meio à inflação, muitos alertam que ela pode aprofundar desigualdades e acelerar o esvaziamento das escolas públicas.
A política foi aprovada rapidamente como parte de um acordo político entre o governo e o partido de oposição Japan Innovation Party (JIP), para garantir a aprovação do orçamento de 2025. A partir do ano letivo de 2026, o limite de renda para que famílias recebam auxílio será eliminado nas escolas privadas, com o valor máximo do subsídio chegando a 457 mil ienes (cerca de 3.150 dólares), valor próximo ao da mensalidade média.
Escolas públicas em desvantagem
A iniciativa, no entanto, preocupa gestores e professores de escolas públicas, que enfrentam desafios como queda nas matrículas, falta de recursos e excesso de trabalho docente. Muitos colégios funcionam como redes de apoio para alunos em situação de vulnerabilidade, com dificuldades de aprendizado, transtornos do desenvolvimento ou em condição de pobreza.
Em uma escola pública nas montanhas nos arredores de Tóquio, por exemplo, apenas 11 estudantes participaram de uma aula de inglês interativa. O professor Shunsuke Nakamura disse que se esforça para oferecer uma educação personalizada, apesar do aumento da carga de trabalho.
“Mesmo sendo exaustivo, meu foco é motivar os alunos e atender às suas necessidades individuais”, afirmou Nakamura.

A diretora Mariko Matsuzaki destacou que, embora a escola ofereça cursos únicos e tenha parcerias com a comunidade local, ainda sofre para atrair novos estudantes: “Nossas atividades não são plenamente reconhecidas nem pelos próprios moradores”.
Em outra escola pública de destaque, a Tokyo Metropolitan Kokusai High School, localizada em Shibuya, cerca de um terço dos estudantes são estrangeiros ou japoneses que retornaram do exterior. A diversidade cultural é um dos pilares da instituição.
Durante um evento escolar, os alunos fizeram discursos em inglês e apresentações em chinês, francês, alemão, coreano e espanhol. O professor Haruki Honma destacou que “a troca internacional acontece diariamente, dentro e fora da sala de aula”.

Debate ignora impacto no sistema educacional
Apesar de experiências positivas em algumas escolas públicas, especialistas criticam a ausência de um plano claro para equilibrar o sistema educacional como um todo. Segundo o professor Hideyuki Konyuba, da Universidade Teikyo, a política força as escolas públicas a competir com as privadas sem oferecer os mesmos recursos.
“É preciso que o governo também invista nas escolas públicas com mais professores e verba adequada”, defendeu Konyuba. Ele destacou ainda que, embora o ensino médio não seja obrigatório por lei no Japão, cerca de 99% dos alunos do ensino fundamental continuam os estudos, o que torna o ensino médio “praticamente obrigatório na prática”.
Regiões como Osaka e Tóquio, que já aplicam programas locais de ensino médio gratuito, observaram um aumento no número de estudantes migrando para escolas privadas, levantando dúvidas sobre o futuro das instituições públicas.
Enquanto a medida é celebrada como alívio para o bolso das famílias, cresce o apelo para que o governo elabore uma política educacional mais equilibrada, que preserve o papel das escolas públicas como espaços de acolhimento, diversidade e igualdade de oportunidades.
Com informações via Mainichi Shimbun