Cancelamento do projeto Japão-África após onda de protestos expõe tensão sobre imigração e intercâmbio cultural

Cidades japonesas enfrentam milhares de críticas e vandalismo após mal-entendido sobre programa da JICA; especialistas alertam para avanço de movimentos xenofóbicos e risco à cooperação internacional.

O projeto “Japan-Africa Hometown”, criado pela Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA) para promover intercâmbio cultural com países africanos, foi cancelado em 25 de setembro após uma onda de protestos e desinformação que associou erroneamente a iniciativa à promoção de imigração africana.

A cidade de Imabari, na província de Ehime, designada como “hometown” de Moçambique, recebeu 2.400 ligações e 3.500 e-mails até o dia 24, com mensagens contrárias ao projeto. Pichações como “no immigration”, “scrap it” e “oppose African immigrants” foram encontradas duas vezes nos banheiros da prefeitura, levando a um boletim de ocorrência por vandalismo.

Segundo Takehito Watanabe, chefe do setor de turismo de Imabari:

“Nossa cidade não pediu a retirada do projeto, mas foi uma decisão razoável. Nossa equipe estava exausta física e mentalmente.”

Cancelamento e reação da JICA:

O presidente da JICA, Akihiko Tanaka, afirmou que os termos “designação” e “hometown” geraram mal-entendidos sobre imigração, e que a agência não promove iniciativas de imigração.

“Não cedemos à confusão. Foi uma decisão para proteger as operações locais”, disse Tanaka.

O Ministério das Relações Exteriores, envolvido no projeto, reconheceu que o cancelamento pode ser visto como uma “vitória” por movimentos xenofóbicos, mas concluiu que as prefeituras não conseguiriam sustentar o projeto diante da pressão.

Além de Imabari, outras três cidades enfrentaram situações semelhantes:

Sanjo (Niigata) – Designada como “hometown” de Gana

  • Recebeu cerca de 9.000 mensagens
  • Cancelou visita oficial de delegação ganesa e projetos de cooperação
  • Teve o nome da prefeitura alterado por brincadeira online para “Ghana City Hall”
  • Prefeito Ryo Takizawa reafirmou compromisso com a amizade internacional

Nagai (Yamagata) – Designada como “hometown” da Tanzânia

  • Recebeu mais de 1.000 ligações e 3.000 e-mails até 22 de setembro
  • Protestos interromperam funcionamento da prefeitura
  • Algumas mensagens continham comentários racistas
  • Prefeito Shigeharu Uchiya reafirmou laços com a Tanzânia desde os Jogos Olímpicos de Tóquio 2021

Kisarazu (Chiba) – Designada como “hometown” da Nigéria

  • Recebeu cerca de 9.000 ligações e 4.000 mensagens online
  • Críticas também atingiram organizações parceiras, como a Japan–Africa Baseball and Softball Foundation, que promove intercâmbio esportivo com oito países africanos
  • Diretor Shinya Tomonari lamentou:

“Isso não tem nada a ver com imigração. É apenas triste. Espero que parem com o ódio contra estrangeiros.”

Alerta de especialistas:

O professor de sociologia política da Universidade de Waseda, Shunsuke Tanabe, alertou que o cancelamento pode ser visto como um “caso de sucesso” por grupos xenofóbicos, incentivando novos protestos baseados em desinformação.

Tanabe também destacou que o Japão já aceita muitos estrangeiros como imigrantes de fato, mas evita reconhecê-los formalmente, o que exige debate público e formulação de políticas claras.

“Há uma necessidade crescente de discutir as relações com estrangeiros no Japão”, afirmou.

Com informações via Mainichi Shimbun