Com produção global em queda e agricultores abandonando o cultivo, inovação japonesa promete manter aroma e amargor mesmo sob temperaturas extremas.
As mudanças climáticas estão ameaçando a produção global de lúpulo, ingrediente essencial para o aroma e o amargor da cerveja. Mas a japonesa Kirin Holdings pode ter encontrado uma solução: a empresa desenvolveu uma tecnologia para cultivar lúpulo resistente ao calor, sem comprometer o sabor.
A inovação foi apresentada em junho na Convenção Internacional de Produtores de Lúpulo (IHGC), na Alemanha, e já recebeu pedido de patente. A técnica será aplicada inicialmente no Japão e, a partir de 2026, em testes de campo no exterior.
Como funciona a tecnologia?
O projeto começou há três anos com base no conceito de “aclimatação térmica”, expor mudas a temperaturas moderadas para que resistam melhor ao calor extremo. A Kirin tratou mudas das variedades Saaz (República Tcheca) e Hersbrucker (Alemanha) a 25 °C antes do cultivo. Elas cresceram bem mesmo sob 30 °C, sem sinais de estresse térmico ou perda de qualidade.
Além disso, as mudas resistiram a 10 dias sem água, simulando condições de seca. Em testes realizados em Iwate, Japão, as plantas pré-tratadas cresceram mais e desenvolveram mais folhas do que as não tratadas. O aroma e o amargor, elementos cruciais para a cerveja, permaneceram intactos.

Crise global do lúpulo:
Segundo o relatório da BarthHaas 2024/2025, a produção mundial de lúpulo caiu 3,9% em 2024, totalizando 113.538 toneladas. A área cultivada recuou 7,7%, com destaque para os EUA, que reduziram 18% de sua área plantada.
A Europa também sofre: um estudo publicado na Nature Communications prevê que, até 2050, os rendimentos de lúpulo podem cair 18% e o teor de ácidos alfa, responsáveis pelo amargor, pode cair até 31%.
Além disso, o mercado enfrenta sobrecarga de contratos não utilizados, queda na demanda por cervejas artesanais intensamente lupuladas e preferência por estilos mais leves e bebidas com baixo teor alcoólico.
Clima extremo no Japão:
No Japão, os principais produtores estão em Tohoku e Hokkaido, mas enfrentam verões cada vez mais quentes e chuvas intensas. Em Tono, Iwate, a temperatura média de verão subiu de 27 °C para 33 °C, fazendo com que os cones de lúpulo caiam antes da colheita.
As chamadas “chuvas guerrilheiras”, pancadas intensas e rápidas, não são absorvidas pelo solo, prejudicando o crescimento das plantas. “O lúpulo precisa de água constante, não de enxurradas,” alerta Junpei Anbe, líder da cooperativa agrícola de Tono.
Falta de agricultores especializados:
Outro desafio é a falta de mão de obra qualificada. O número de produtores de lúpulo no Japão caiu de 6.682 em 1970 para apenas 96 em 2023, segundo a federação nacional de cooperativas.
Diante desse cenário, a Kirin aposta na tecnologia como solução para manter a produção e a qualidade da cerveja japonesa, mesmo com o avanço do aquecimento global.

“Queremos garantir que a cerveja continue deliciosa, mesmo com o clima mudando,” afirma Riko Imahori, pesquisadora da divisão de P&D da Kirin.
Com informações via Asahi Shimbun