Documento aponta que mudanças climáticas, perda de espécies, degradação da terra e poluição estão ligadas e exigem políticas integradas e investimento urgente
Um novo relatório da ONU divulgado nesta terça-feira afirma que o mundo precisa adotar uma abordagem totalmente integrada para enfrentar as crises ambientais que ameaçam a saúde das pessoas e do planeta. O documento, parte da avaliação quadrienal Global Environment Outlook do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), diz que problemas como mudança climática, perda de biodiversidade, degradação do solo e poluição são inseparáveis e devem ser combatidos ao mesmo tempo.
Segundo os autores, isso exige mais investimentos, incentivos financeiros para reduzir o uso de combustíveis fósseis, práticas agrícolas sustentáveis, controle de poluentes e redução de resíduos. “Você não pode pensar em mudança climática sem pensar em biodiversidade, degradação do solo e poluição”, afirmou Bob Watson, um dos principais autores do estudo e ex-cientista da NASA e do governo britânico. Ele alertou que todos esses fatores estão prejudicando economias, ampliando a pobreza, piorando a saúde e colocando em risco a segurança alimentar, hídrica e até nacional.
Cerca de 300 cientistas de 83 países contribuíram para o relatório, que foi apresentado durante a Assembleia do Meio Ambiente da ONU, em Nairóbi, no Quênia. Eles reforçam que, apesar de décadas de discussões, as ações globais ainda avançam de forma isolada e insuficiente para conter a crise ambiental.
Risco de ponto de não retorno
O relatório alerta que o planeta pode estar próximo de um “ponto de inflexão”, momento em que os danos se tornam irreversíveis. As emissões globais de gases de efeito estufa atingiram um novo recorde em 2024, apesar do Acordo de Paris, firmado por quase 200 países há dez anos. No ritmo atual, a temperatura média global pode subir 2,4°C até 2100 — acima do limite de 1,5°C considerado essencial para evitar os piores impactos.
Especialistas apontam que a mudança climática intensifica eventos extremos, como tempestades, secas, ondas de calor e incêndios florestais. A cientista Katharine Hayhoe, da Texas Tech University, disse que o aquecimento global também agrava a degradação da terra, o desmatamento e a extinção de espécies. “Se não resolvermos o clima, não vamos resolver os outros problemas”, afirmou.
Hoje, até 40% das áreas terrestres do planeta estão degradadas, mais de 1 milhão de espécies estão ameaçadas e a poluição está ligada a cerca de 9 milhões de mortes anuais.
Custos e benefícios
O relatório reconhece que a transformação ambiental será cara, mas muito menos custosa do que os danos futuros. Para atingir emissões zero em 2050 e restaurar a biodiversidade, seriam necessários cerca de US$ 8 trilhões por ano em investimentos globais. A partir de 2050, os benefícios econômicos superariam os gastos, chegando a US$ 20 trilhões por ano em 2070 e podendo ultrapassar US$ 100 trilhões posteriormente.
Os autores defendem também que os países precisam ir além do PIB como indicador de desenvolvimento, pois o índice não considera se o crescimento é sustentável ou se causa danos ambientais.
Cooperação global fragilizada
Apesar da urgência, a cooperação internacional está em dificuldade. O relatório aponta que decisões importantes têm avançado lentamente, e negociações recentes sobre clima e poluição não tiveram resultados robustos. A ausência de participação ativa dos Estados Unidos em parte das discussões também preocupa cientistas.
Bob Watson afirmou que alguns países podem hesitar em agir quando grandes nações não demonstram compromisso. Ainda assim, acredita que várias nações seguirão adiante, enquanto outras ficarão para trás.
Para a pesquisadora Katharine Hayhoe, as mudanças acontecerão porque os riscos já são claros demais. “Não se trata de salvar o planeta — ele continuará existindo. A questão é se haverá uma sociedade humana saudável e próspera. E essa resposta ainda está em aberto”, disse.
