Pesquisa com 73 mil idosos mostra que cidades com mais livros em bibliotecas têm menos casos de idosos que precisam de cuidados prolongados.
Um estudo inovador revela que a abundância de livros em bibliotecas públicas está correlacionada com uma menor necessidade de cuidados de enfermagem de longo prazo entre os idosos japoneses, indicando que as bibliotecas são verdadeiros centros de bem-estar.
Pesquisadores japoneses descobriram que quanto mais livros em bibliotecas públicas um município possui, menos moradores necessitam de cuidados de enfermagem de longo prazo. Essa intrigante correlação foi o foco de um artigo de pesquisa intitulado “Bibliotecas públicas e deficiência funcional: um estudo de coorte de idosos japoneses”, e o Mainichi Shimbun conversou com um dos seus autores para desvendar o mistério.
A pesquisa foi liderada por Koryu Sato, professor da Faculdade de Gestão de Políticas da Universidade Keio, e Saeko Otani, formada pela Faculdade de Medicina da Universidade de Kyoto, atualmente em treinamento. Eles utilizaram os resultados de uma pesquisa que acompanhou mais de 70.000 idosos ao longo de sete anos, e o estudo foi publicado na edição de março do periódico médico SSM – Population Health.

“Então, o que acontece com as bibliotecas?”, questionou Sato, cuja expertise abrange economia médica e epidemiologia social. A pesquisa nasceu do desejo de Otani, uma aspirante a médica e leitora ávida, de estudar a relação entre leitura e saúde.
Muitos estudos anteriores já haviam explorado a conexão entre hábitos de leitura e saúde. Um estudo da Universidade de Yale (2016) mostrou que leitores tinham uma taxa de mortalidade 20% menor ao longo de 12 anos. Outras pesquisas indicaram que a leitura ajuda a prevenir o declínio cognitivo. No entanto, Sato percebeu que “ler por si só não traria novidade”, levando Otani a sugerir: “Então, o que há de tão especial nas bibliotecas?”. Assim, eles embarcaram em seu estudo singular sobre bibliotecas e saúde.
Uma Correlação Inesperada e Robusta
Os pesquisadores utilizaram dados do Estudo de Avaliação Gerontológica do Japão, uma das maiores pesquisas com idosos no país. O estudo analisou dados de 73.138 pessoas com 65 anos ou mais que eram saudáveis em 2013 e viviam em 19 cidades, acompanhando-as até 2021. Durante esse período, 16.336 indivíduos (22,3%) foram certificados como necessitando de cuidados de enfermagem de longo prazo.
Sato e Otani examinaram o número de livros em bibliotecas públicas nesses municípios e analisaram sua relação com o número de certificações para cuidados de longa duração. “Na verdade, não esperávamos uma correlação entre bibliotecas e saúde”, admitiu Sato. Os resultados foram, portanto, surpreendentes.
A análise dos dados revelou uma clara correlação: municípios com um livro a mais per capita tiveram 4% menos certificações de cuidados, e aqueles com 10 livros a mais per capita tiveram impressionantes 34% menos certificações. A média nacional é de cerca de 3,7 livros por pessoa, mas em Tóquio, por exemplo, o número varia de aproximadamente dois a oito livros por ala.
Alguns poderiam questionar se municípios com muitas bibliotecas são simplesmente mais ricos. No entanto, Sato explicou que os resultados levaram em conta fatores demográficos e socioeconômicos, como idade, gênero, anos de educação, renda familiar, estado civil, situação de emprego, participação social, solidez financeira municipal e densidade populacional. “O que descobrimos é apenas uma correlação, não uma relação causal estrita”, disse Sato, “No entanto, mesmo após remover a influência de vários fatores, a correlação com o risco de cuidados de longa duração ficou clara.”
Benefícios Amplos: Além da Leitura
O estudo também constatou que, embora houvesse uma correlação significativa entre o número de livros na biblioteca e os riscos de cuidados de longo prazo entre aqueles com hábitos de leitura estabelecidos, a correlação ainda existia entre os não leitores. Isso sugere que morar em um município com muitos livros na biblioteca pode prolongar a expectativa de vida saudável, mesmo para aqueles que não leem.

Por que os livros da biblioteca beneficiam a saúde dos idosos? Sato sugeriu: “Acredito que o número de livros indica a riqueza da biblioteca. Acredita-se que ter uma excelente biblioteca por perto oferece benefícios físicos, cognitivos e de participação social.”
Ele detalhou três principais benefícios:
- Efeito Físico: “Ir à biblioteca em vez de ler em casa contribui para a saúde. Estudos anteriores mostram que ficar sentado por muito tempo é prejudicial à saúde e, mesmo sem exercícios físicos, apenas uma caminhada leve já é benéfica.”
- Função Cognitiva: “Ler em si é um treinamento cerebral e, diferentemente da leitura regular, ir à biblioteca proporciona encontros inesperados com livros, ampliando o conhecimento. Eventos na biblioteca também podem estimular a curiosidade intelectual.”
- Participação Social: “Participar de atividades regulares, como hobbies, ajuda a manter a função cognitiva e a reduzir a mortalidade, de acordo com estudos anteriores. O Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social também se concentra em ‘espaços comunitários’ onde idosos podem realizar atividades para prevenir cuidados e fragilidade. Um grande acervo de livros indica que a biblioteca é grande e pode servir como um centro para atividades comunitárias. As bibliotecas também dispõem de aquecimento e refrigeração. Isso potencialmente preenche as lacunas econômicas e ambientais para idosos, como aqueles com ou sem ar-condicionado.”
As bibliotecas oferecem, de fato, benefícios que vão além da simples leitura, como vantagens de participação física e social.
A Chave é a “Participação Social”
Durante a semana, as bibliotecas ficam lotadas de idosos que são “frequentadores regulares”. Anteriormente, eles eram vistos negativamente no Japão como “pessoas que não conseguem aproveitar a aposentadoria”. No entanto, saber que visitas regulares à biblioteca reduzem o risco de cuidados de longo prazo pode mudar a percepção das pessoas ao seu redor.

Curiosamente, a correlação entre o número de livros da biblioteca e a saúde foi mais forte entre as mulheres do que entre os homens neste estudo. Sato especulou: “Pode ser devido ao grau de ‘participação social'”. Ele acrescentou: “Enquanto os homens se beneficiam física e cognitivamente das visitas à biblioteca, as mulheres se destacam esmagadoramente na participação social. Nesse sentido, acredito que as mulheres provavelmente se beneficiam mais de eventos da biblioteca e atividades em grupo.” De fato, a “participação social” pode ser a chave para melhorar ainda mais a saúde dos homens idosos que frequentam bibliotecas.
Com informações via Mainichi